4 de setembro de 2007

Sufis, Os Ébrios de Deus...

Sufis, Os Ébrios de Deus...


Todos os movimentos espirituais têm seus pontos de contato, e o islamismo não é exceção. Nele, a Tradição tão largamente estudada por René Guénon (que, lembre se, encerrou seus dias como muçulmano) está enfeixada pelas seitas sufistas, datadas possivelmente de antes de Maomé. Após um início sob perseguições, os sufis acabaram por fazer prevalecer sua pregação, grandemente tolerante e que faz uso de numerosíssimos recursos em sua busca a Deus.



“Como posso definir aquilo que sou?”, pergunta se, no início de um poema, o místico sufi Mirzá Khan. Hoje, séculos mais tarde, a pergunta permanece sem resposta. De fato, é difícil definir o sufi, ao mesmo tempo místico e extático, ascético e mártir que condena a fuga do mundo, e é também responsável pelas mais belas manifestações do gênio islâmico. Difícil não só porque sua existência é ignorada no Ocidente a não ser por alguns poucos estudiosos , mas também porque entre os próprios muçulmanos há muitos que olham os sufis com desconfiança (se não com aversão), graças aos excessos e extravagâncias de alguns de seus expoentes.



Existem ainda empecilhos para rastrear sua origem, mas uma corrente lhes reivindica passado tão remoto quanto o das ordens iniciáticas egípcias e hindus, classificando o sufismo como segmento árabe de uma confraria universal, herdeira e guardiã de um conhecimento ancestral de Deus, o qual, à medida do necessário e do oportuno, vem sendo transmitido à humanidade no correr dos séculos, desde Adão aos nossos dias.



Aos céticos, é bom recordar que a teoria não parece tão absurda a um estudioso do nível de Idries Shah, diplomata e erudito muçulmano, que sobre ela escreveu:


"Se as maravilhas dos sufis e dos gurus hindus, os bruxos africanos e curandeiros da Amazônia, devem ser investigadas com um espírito verdadeiramente científico, não se pode colocar nenhuma questão de crença ou descrença. Temos de admitir que não demonstramos conclusivamente inexistir uma tradição esotérica secreta. Não podemos explicar as semelhanças em bases psicológicas: que esses ritos são apenas simbólicos dos esforços limitados e naturais do homem pela superioridade."



Todas as grandes religiões abrigam em seu seio uma tradição oculta originalmente não escrita, à qual o acesso não é negado, mas que obriga o indivíduo a uma iniciação mais ou menos severa, sob a supervisão de um mestre.
No budismo há as correntes do tantra e do zen; no cristianismo, o Evangelho apócrifo, atribuído ao apóstolo Tomé, reivindica conter esse saber "oculto"; no judaísmo existe a cabala; e, no islamismo, as ordens sufistas.



“...Só quando cessa o agitado transcorrer das ondas, o oceano ilimitado mostra sua serenidade eterna...”
(Pensamento sufi)



SUFISMO – O CAMINHO DO AMOR



O Sufismo foi definido como o Caminho do Amor ou do Coração. A palavra “Sufi” é lhe atribuída várias origens, entre elas palavras que significam “pureza” e “sabedoria”. O Sufi, então é alguém que descartou tudo o que não pertence a sua Essência mais íntima e que cultivou o jardim do coração, já que não há outro lugar para que a sabedoria cresça. Um sufi é um homem com os pés na terra e a cabeça no céu.



Poderia dizer que sufismo é acercar-se amorosamente da realidade. É um modo de experimentar a vida e o universo como um todo respondendo a um plano Único, de acordo a umas Leis Universais ou Fundamentais. É uma escola viva ou forma de vida que busca antes de tudo fazer um chamado em direção a Unidade de toda a existência e a que cada ser humano alcance seu verdadeiro estado de plenitude e bem estar, integrando em si mesmo a transcendentalidade ou espiritualidade, é dizer o mais significativo e fundamental que existe em cada um de nós. Dentro do sufismo se busca liberar o ser humano das correntes da ignorância para que possa compreender a essência imutável do Ser.



“Conheci o bem e o mal, pecado e virtude, justiça e infâmia, julguei e fui julgado, passei pelo
nascimento e a morte, pela alegria e pela dor, o céu e o inferno; e ao final
reconheci que eu estou em tudo e tudo está em mim”.
Hazrat Inayat Khan



A palavra sufi implica pureza e a pureza consiste de qualidades. Puro quer dizer não misturado com outro elemento, ou em outras palavras àquele que existe em seu próprio elemento, puro sem manchas. Dentro do sufismo se busca honrar e respeitar todas as diferenças e buscar um entendimento mútuo, respeitando e valorizando todos os pontos de vista dos demais. Pode-se dizer que é uma escola de autoconhecimento e aperfeiçoamento do ser humano; um estudo da Unidade e limpeza da própria personalidade para refinar suas arestas e fazer a maior obra de arte a que todo ser uma está chamado: A Arte da Personalidade. Sem dúvidas, todo esse trabalho de polimento e limpeza do cristal do coração do sufi não é para o seu benefício próprio, senão para que possa refletir a Luz Divina.



“A vela não está ali para iluminar-se a si mesma”.
Nawab Jan-Fishan Khan



Se há uma verdade central que o sufismo distingue, é a Unidade do Ser, o fato de que estamos integrados com o Divino. Somos Um: uma comunidade, uma ecologia, um universo, um Ser.Se é que há uma verdade digna de desse nome, é que formamos um todo com a Verdade, que não estamos separados dela. A compreensão desta verdade tem efeitos em nosso sentido de quem somos, em nossa relação com os demais e com todos os aspectos da vida. O sufismo tem a ver com a compreensão da corrente de amor que corre através de toda forma de vida, com a unidade detrás de todas as formas conhecidas e desconhecidas pela humanidade.



Para os sufis toda a humanidade é Uma só, não existe nenhum tipo de divisão nem horizontal nem vertical e não existem seres diferenciados. Não existem coisas diferenciadas ou separadas salvo em aparência e em um nível superficial. Em seu núcleo, em seu nível mais fundamental somente existe uma só coisa: A Unidade, ou Realidade Absoluta, O Uno. Aquele a que é dado muitos nomes e que designam como Deus, Allah, O Universo, a Vida, A Informação Central do Universo, O Vazio, O Todo, etc. O nome que se assina a esta Realidade não é relevante, pois todos esses conceitos apontam para a mesma e única direção.



A prática do sufismo leva a redução da falsa personalidade a sua mínima expressão, portanto a manifestação plena de nossa essência o Ser Real, o qual facilita o aceso direto a percepções reais da Verdade, que surgem na experiência pessoal de cada um. Nesta senda se vai refinando o ego, desfazendo suas limitações e enaltecendo nossos talentos. Quando no sufismo se fala da redução do ego, há que se entender que sem um ego não podemos interagir neste plano material. É necessário para nossa sobrevivência. Trata-se de coloca-lo ao nosso serviço e não ser escravo dele.


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O sufismo está baseado na Harmonia, na Beleza e o Amor. Para estar unidos com o Uno, com Deus e Sua Criação, que são uma mesma e indefinida coisa, nos ocupamos então de limpar nosso coração de tudo o que signifique ego ou autoengano.



Os sufis não têm hierarquia distinta ao crescimento espiritual ou desenvolvimento de consciência. Não tem dogmas nem doutrinas. Para eles o caminho se faz no mundo, entre os homens e não há nada mais valioso do que as relações, especialmente as complexas. Não tem muito mérito ser imperturbável se ao seu lado nada há que o perturbe. Quando se reúnem vários sufis, o mais avançado ensina se esta é sua missão e ele sabe perfeitamente se é ou não. Os demais também. Brota assim, espontaneamente, a função do mestre, a quem se acata, se respeita, porém antes de tudo se ama porque nos mostra um ideal. Não é dado ao sufi a condição de mestre sem a capacidade de ensinar e com esta vem acompanhada a capacidade de amar, que dá ao mestre a agudeza perceptiva dos sentidos físicos, afinados em sumo grau e o desenvolvimento de outros sentidos superiores latentes em qualquer homem.



Os exercícios espirituais, as práticas, são de ampliada variedade e dependem sempre das condições do tempo, maneira e lugar, porém, alguns mais da capacidade atual do discípulo ou aprendiz e/ou seu estado de desenvolvimento de consciência. Podem consistir em práticas como certas respirações, mantras ou afirmações (faladas ou cantadas), danças, música e muitos contos ou histórias.



“Sufi é alguém quem AMA e RESPEITA toda a criação do universo. E Sufismo é a Luz Brilhante que resplandece no coração daqueles que AMAM e RESPEITAM.”
Ananda



“Não nos interessa converter todos ao sufismo. Nos interessa o efeito que exerce o sufi a sua volta. É como a levedura do pão. É muito pouco diante da quantidade de massa e é o único “vivo”, porém faz com que todo pão viva. Há muitos caminhos, uns mais largos, outros mais inclinados, alguns com flores, outros com espinhos; o sufismo é um deles e não sustentamos que seja o melhor. De fato pode ser pior que outros. Há que encara-lo como quem entra em um laranjal, com muitos tipos de laranjas. Se você gosta das laranjas dessa árvore fique aqui, se não provas as de outra árvore.”


Murshid Nawab William Pasnak


Fonte: http://www.personarte.com/sufismo.htm
Texto: Traduzido por Marilena Rodriguez

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